Recentemente, me vi surpreendido com uma opinião totalmente crítica à arbitragem societária de uma doutrinadora por quem tenho profundo respeito pelo seu trabalho acadêmico. A respeitada doutrinadora de direito societário e mercado de capitais Érica Gorga tratou da defesa do interesse dos minoritários brasileiros no caso Petrobras em recente entrevista dada à Folha de São Paulo[i].
Quando questionada sobre se o caso poderia parar na arbitragem, a Dra. Gorga trouxe severos ataques ao instituto da arbitragem no mercado de capitais. Entre as suas razões, dizia a Doutrinadora ao conhecido jornal que se trata de meio de solução de conflitos muito caro e inacessível aos minoritários, que os árbitros em geral são profissionais que são normalmente contratados pelos acionistas controladores para dar pareceres e, portanto, parciais; e que a arbitragem seria inconstitucional no âmbito das companhias abertas por impedir ações coletivas e por ser sigilosa, incompatibilizando-se com as regras de disclosure do mercado.
Entendo que a arbitragem no âmbito do mercado aberto tem potencial para ser exatamente o contrário do que manifestou a respeitável Professora. O sistema de ações coletivas brasileiro não atende os anseios do direito societário, não sendo mecanismo confiável e eficiente para proteger os investidores. Primeiro pelo que a própria Dra. manifestou na entrevista, relativo ao uso limitado das ações coletivas por pessoas privadas. Em segundo lugar por cair no lento procedimento judicial. Terceiro, o Julgador que analisará as questões raramente abre um livro de direito societário e mercado de capitais durante sua carreira profissional, pois raríssimas são as varas judiciais especializadas em direito societário e menos ainda em mercado de capitais.
De outro lado temos a arbitragem. Novamente, sofre ataque a constitucionalidade, agora por impedir supostamente por falta de consentimento dos acionistas. Mesmo no mercado americano, onde as class actions funcionam muito bem para proteger investidores, podemos encontrar precedentes favoráveis, em razão da clara efetividade e imparcialidade deste meio de solução de conflitos mesmo comparados com as poderosas class actions[ii] . Não é inconstitucional a arbitragem, pois o estatuto da companhia é documento público ao qual os investidores aderem, podendo se retirar da companhia por meio da venda de suas ações no mercado, uma vez que a Petrobras sempre teve ações com liquidez e dispersão, não podendo trazer o argumento de falta de consentimento só na hora de ajuizar a ação (lembrando que com a mudança da Lei, a inclusão da cláusula arbitral gera direito de retirada do acionista dissidente). Também sem razão quando se fala em falta de independência dos árbitros, pois estes se submetem a um rigoroso escrutínio para saber se em algum momento tiveram relações com alguma das partes envolvidas, que além do controle dos próprios árbitros, sofrem controle das partes e do judiciário, sendo causa de anulação do processo (arts 13, 32 e 33 da Lei 9.307/96). Quanto ao custo da arbitragem, existem diferentes soluções para o problema, como, por exemplo, os modernos contratos onde terceiros financiam as custas (obviamente por uma justa contraprestação). Além disso, a própria companhia poderia criar uma reserva para financiar procedimentos arbitrais legítimas. Finalmente, diversos estudos demonstram a relação entre custo e a eficiência do procedimento arbitral que, ao fim das contas, acaba sendo mais barato do que o processo judicial.
Enfim, entendo que os acionistas da Petrobras tem muito a ganhar pelo uso da arbitragem, terão uma solução mais técnica e mais rápida. Vejo que o futuro dá arbitragem societária passa pela criação da class arbitration, como substituto da class action, que já vem sendo analisado em outros países[iii].
[i] Entrevista
da Dra. Erica Gorga. “'Considerar Petrobras vítima da corrupção é rasgar leis',
diz advogada” - http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/08/1668646-considerar-petrobras-vitima-da-corrupcao-e-rasgar-leis-diz-advogada.shtml
[ii] The Washington Post. Supreme
Court says arbitration agreements can ban class-action efforts Disponível em
<http://www.washingtonpost.com/politics/supreme-court-says-arbitration-agreements-can-ban-class-action-efforts/2011/04/27/AFp23j0E_story.html>,
acessado em 20 de Junho de 2015; Dotson, Alyesha A.. The Supreme Court Speaks
on Class Action Waivers in Arbitration Agreements
<http://www.americanbar.org/publications/tyl/topics/labor-employment/the_supreme_court_speaks_class_action_waivers_arbitration_agreements.html>;
Kane, Matthew C. et. Al. United States: California High Court Upholds Class
Action – But Not Representative Action – Waivers In Arbitration Agreements
<http://www.mondaq.com/unitedstates/x/325604/employment+litigation+tribunals/California+High+Court+Upholds+Class+Action+but+not+Representative+Action+Waivers+in+Arbitration+Agreements.>
acessado em 20 de Junho de 2015.
[iii] Strong, S.I., Resolving Mass
Legal Disputes Through Class Arbitration: The United States and Canada
Compared. North Carolina Journal of International Law and Commercial
Regulation, Vol. 37, p. 921, 012; University of Missouri School of Law Legal
Studies Research Paper No. 2011-24. Disponível em SSRN:
http://ssrn.com/abstract=1967101, P. 977.
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